A volta do ano perdido
Sobre o aumento de um ano na duração do ensino fundamental
No final de 1971, já tinha estudado o ano todo para fazer meu exame de admissão, pois disso dependia a vaga numa boa escola ginasial pública, quando tudo mudou. A educação fundamental foi reduzida em um ano, meu Grupo Escolar criou mais séries, e fiquei ali mesmo. Essa brilhante idéia me permitiu escolher um destino e entrar na universidade com ridículos e insuficientes 17 anos, um ano mais imatura e confusa do que poderia ser. Cabe lembrar que um ano a mais durante a juventude, vale por uns cinco na vida adulta. Os primeiros tempos da vida são anos de formação, a vida é consumida com avidez, tudo se metaboliza, transforma, marca.
Por sorte, o ano letivo que foi retirado está finalmente sendo restituído às crianças, através da implementação dos nove anos de primário. Como muita falta me fez, estou pensando em cursá-lo agora, resta encontrar uma escola.
Porém, tenho visto muita gente na contramão dessa idéia. Muitos pais estão preocupados com o acréscimo de um ano de estudo na vida dos filhos. Temem que ficarão desmotivados com a ampliação das séries iniciais, como se eles tivessem alguma pressa, ou ainda a quantia de conhecimento fosse insuficiente para preencher tantos anos. Eu acho que nove anos ainda é pouco, além disso, não vejo o por quê dessa divisão boba entre primeiro e segundo grau.
Ensino fundamental é fundamental, e por longos anos. A divisão entre graus dá a ilusão de conclusão de uma etapa de ensino suficiente, hoje até formatura tem. A reforma de ensino da época colocou os cursos profissionalizantes de segundo grau como continuação natural do ensino primário. A idéia era preparar para alguma profissão a todos aqueles que não tivessem a “vocação” econômica de cursar o ensino superior. Parecia interessante formar mão de obra técnica em massa, tanto quanto neutralizar intelectuais e subversivos, que incomodavam nas escolas e universidades. O que de fato ocorreu foi o enfraquecimento das boas e tradicionais escolas técnicas e a instituição de cursos profissionalizantes improvisados nas escolas regulares.
Hoje não temos dúvidas de que a educação pode e deve ocupar muito mais espaço em nossa sociedade, o atual crescimento descontrolado de universidades privadas provou que o Brasil precisa, o mercado exige e o povo gosta de continuar estudando. Porém, a preocupação em abreviar, em demarcar trechos do caminho, que dão a ilusão de etapa superada (formatura de jardim, por exemplo), reflete uma urgência de caráter psicológico: somos pais e educadores impacientes, admiramos nos jovens a precocidade,
Hoje tudo urge e as distâncias se encurtam, mas o tempo do homem segue igual, não há placa aceleradora, nem memória extra para comprar. Educar continua sendo uma tarefa demorada, que requer paciência de monge. Somos lentos para virar gente e a cultura é de digestão demorada. Em cultura, só devagar é que se vai longe. Ainda bem que cada vez duramos mais, portanto, se bem há muita coisa para aprender, também há mais tempo para viver. E para ensinar a viver.