Bruxinhas de oito a doze
Ssobre o desenho animado WITCH
Quando eu era pequena e nas brincadeiras me perguntavam: “quem eu queria ser”, minha opção era pela Vanderléia (cantora da Jovem Guarda), os meninos da época escolhiam algum que usasse revólver, mas a ninguém ocorreria pedir para ficar com papel de bruxa ou feiticeiro, o que aliás consideraríamos digno de levar uma boa coelhada.
Porém, quem convive com meninas de 8 a 12 anos hoje, sabe que elas disputarão papéis entre Will, Irma, Taranee, Cornélia e Hay Lin (nomes da sigla WITCH). São cinco bruxinhas pré-adolescentes, dotadas de poderes mágicos associados aos quatro elementos, guardiãs das muralhas de uma terra que é o exílio do bem. Elas só existem em revistas, livros, figurinhas e material escolar. Você não as encontrará em desenhos animados, brinquedos ou filmes. Talvez elas ainda assumam essa forma, mas já existem no Brasil há dois anos e ainda vivem em duas dimensões, numa revista criada pela Disney italiana.
As cinco meninas em verdade se enfrentam com os desafios das transformações e desequilíbrios próprios da fase puberal. Sua imagem no espelho é uma incógnita, vestir-se um drama de identidade, a relação com os pais fica tensa, além disso sofrem de um mau humor contumaz. Não bastasse esse estado de TPM constante, o mal estar é potencializado pelo sarcasmo que caracteriza a relação das meninas entre si. Um grupo de meninas desta faixa etária é a versão destilada da agressividade contida e militante que existe nos grupos femininos. Versão feminina da violência abrutalhada e meio tosca dos grupos masculinos, os grupos de meninas desenvolvem a arte da mordacidade e da tortura sutil. Qual a mulher que já não passou por isso, como vítima ou como algoz?
Entre um combate e outro com as forças das trevas, as bruxinhas vivem dilemas fraternos, amorosos e éticos. Elas são escolares envergonhadas e cheias de conflitos, quando se transformam em bruxas ficam com corpo de adolescente, roupas ousadas e uma coragem que lhes falta na vida real. Além disso precisam aprender a usar este poder: uma delas, certa ocasião, aproveitou esta aparência mais ousada para ir a uma festa e dançar com um garoto que lhe interessava. A sedução foi um sucesso e o rapaz tentou beijá-la. A reação “mágica” dela foi transformá-lo num sapo, de puro medo. A magia não é apenas um pano de fundo, equivale à presença do recém inaugurado mistério do sexo e das transformações corporais. Aprendendo a usar seus poderes, elas em verdade estão às voltas com desafios menos mágicos, mas igualmente drásticos: crescer e aparecer, como mulheres. A educação das mulheres está a anos luz das aulas de bordado, culinária e piano, é preciso hoje tecer uma identidade diferenciada, descascar e assar a imaturidade e ter o virtuosismo de tocar em seu ritmo pessoal. Haja magia…