Chihiro no país das maravilhas

Sobre o filme A Viagem de Chihiro

Para todos os adultos e crianças que quiserem passar duas horas na terra de Alice, vale a pena comprar um ticket para “A viagem de Chihiro”. A história é simples mas desencadeia um belo e impressionante desfile de personagens estranhos à cultura ocidental.

Os pais de Chihiro, um senhor gordo e guloso e sua esposa prática e obediente, penetram num mundo mágico sem perceber detalhes que só a menina vê. Quando se confrontam com a paisagem bizarra do local, o pai conclui que se trata de um parque temático abandonado. Encontrando uma série de iguarias à disposição num lugar inóspito, os pais declaram que eles têm cartão de crédito e se põem a comer com a voracidade dos porcos em que acabarão por transformar-se. Eles parecem tão ignorantes das referências religiosas e culturais do local quanto nós ocidentais, enquanto Chihiro, ao contrário, demonstra curiosidade e cautela. Mais tarde descobre que está numa casa de banhos para deuses, controlada por uma feiticeira malvada que escraviza ou enfeitiça os humanos. A menina submete-se uma rotina de humilhação e trabalho, mas vai decodificando este novo mundo, fazendo amigos mágicos e assim conquista a liberdade para si e para os que ama.          

Este é mais um filme sobre a jornada de crescimento que se inicia com o fim da infância, mas seu diferencial é que a menina vive suas aventuras imersa no caldeirão da cultura tradicional de seu país. Alice, de Carroll também encontra personagens provenientes do acervo cultural inglês, mas ela é mais turista que guerreira e não precisa lidar com a falta de sabedoria dos seus adultos. Para Chihiro a perda da inocência passa pela solidão, já que seus pais, ignorantes e simplórios, logo sucumbem, e por uma libertação, como a que cabe a todos os que abandonam o ninho. Mas ela viaja para um mundo cheio de vovôs, animado pela mitologia de seu povo, lembrando que para ir adiante é obrigatório recuar. Os avós são importante fonte de suporte nos momentos de crises de crescimento. Eles garantem uma conexão dos netos com uma história de gerações sucessivas, que os coloca como elos de uma cadeia, assim sua caminhada passa a fazer parte de alguma linha do tempo. O filme é uma dura crítica aos pais que vivem um presente cheio de objetos e prazeres imediatos, alienados do contexto histórico e social. Afinal, para ajudar os filhos a crescer, os pais terão que admitir que eles se tornarão o passado de alguém, que o futuro é tecido de passado.

23/07/03 |
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