De quem é?
Antes da erudição, a entrega à arte. Antes ser curioso do que inibido!
Um grupo de jovens em viagem pela Europa fez um experimento cômico: no Louvre, escolheram aleatoriamente uma obra obscura, uma paisagem sem graça, irrelevante se comparada com outras pinturas importantes daquele museu. Admiravam explicitamente o dito quadro, fotografando-se em frente a ele e pedindo aos passantes que os retratassem a seu lado. Não demorou muito para que se criasse uma pequena comoção. O quadro teve seus quinze minutos de fama extra graças ao grupo de admiradores falsários. Várias pessoas se reuniram em torno dele e um guia atônito foi chamado a explicar a pintura de paisagem, pela qual costumava passar em branco.
Como se vê, o valor artístico também é uma questão de prestígio, que o diga o sempre nervoso mercado das artes. As gafes são inevitáveis, pois somos incultos crônicos. A vida é curta para dar conta de todo o acervo disponível para ler, escutar, assistir e olhar. Além disso, nem sempre sentiremos empatia pelas obras consideradas “primas”.
Se não formos críticos, estudiosos ou pesquisadores de qualquer uma das sete (ou mais) artes, não precisamos sentir vergonha de nossos julgamentos. Não é uma questão de etiqueta, é de estética: o “gosto”, “não gosto”, pode e deve ser levado em conta. Por outro lado, o acesso regular à arte costuma tornar a categoria do “gosto” muito mais ampla. Certamente viveríamos num mundo muito melhor se as oportunidades de sensibilização para o belo ou para o diferente estivessem ao alcance de todos.
Meu marido gosta muito de música, já meu ouvido é menos que amador. Prefiro que escolham para mim. Aproveito muito o ambiente que cada som cria, encaro a trilha sonora como uma oferenda do outro. Porém, quando ele me mostra uma música, sou reincidente num hábito que o chateia: antes de me entregar aos acordes, pergunto: “o que é? Ou: “de quem é isso?”. Fora as preferidas que sei de cor, raramente reconheço uma música, o que me envergonha bastante. Ele, paciente que é, me responde sempre: “primeiro escuta, depois te digo o que é!”. Sua ressalva é compreensível, pois antes do prazer da música, antecipo a preocupação com meu prestígio intelectual. Azar o meu, se fosse menos insegura aproveitaria ainda mais as audições caseiras.
No passeio ao museu, sempre vale a pena se informar sobre as obras que vai se ver, mas por que não confiar nos sentidos? Entendo o pessoal que parou na frente da paisagem obscura, usaram o movimento do público como guia, por que não? Depois do encontro com o quadro, o olhar define a paixão, ou não. Não importa como nos deixemos levar até ela, deixar-se arrebatar pelo prazer de uma obra tem que ser mais interessante que a erudição vazia. Em primeiro lugar simplesmente pare, olhe e escute! Depois, aprenda.