Metamorfoses ambulantes
Sobre comunicação virtual, nick names, em 27/07/2005
Quem é assíduo ao computador, particularmente aos espaços de comunicação instantânea e compulsiva, como hoje é o MSN, já está acostumado a reconhecer seus amigos sob diversos disfarces. Além do nick-name, apelido pelo qual alguém se identifica de modo mais ou menos permanente, sempre há uma frase que o acompanha, uma pequena mensagem, que é uma extensão do nome. Pode ser um trecho de letra de música, um recado, ou mesmo a descrição do sentimento ou ação do momento, como “morrendo” ou “sem o q fazer”. O importante é que essa frase muda com freqüência e deve ser atualizada para melhor retratar a situação vigente e o personagem que representa. Esse carnaval de Veneza virtual não visa esconder a identidade de ninguém, mas sim revelá-la em sua condição multifacetada, variável. Não são máscaras que ocultam, são enfeites, que ressaltam e descrevem o estilo e estado de cada um. Como quase tudo em nosso mundo tecnológico e hiper-conectado, estas epígrafes de si mesmo mudam toda hora. Ninguém duvida da necessidade de ser visto e notado em nossa “sociedade do espetáculo”, porém, nesse esforço cotidiano de buscar um apelido e uma frase que nos representem e caracterizem, há mais do que uma mera vontade de aparecer. Não é irrelevante que, além de chamativas, essas confissões públicas sejam evanescentes.
A velocidade é uma mania contemporânea. Achamos que essa urgência toda achatou nossa qualidade de vida, quando na verdade a pressa propriamente dita faz parte da busca angustiada pela tal qualidade de vida. Quando, por exemplo, uma criança pequena fica agitada e irritadiça, exigindo ser levada de cá para lá, que lhe alcancem inúmeros objetos que ela em seguida joga no chão, consideramos que ela está com sono, buscando nesses gestos alívio para um mal-estar difuso, e a tranqüilizamos para que durma. Já quando um adulto muda constantemente de carro, namorado, profissão, estilo, mostrando-se entediado ou insatisfeito com tudo que planeja ou conquista, consideramos que ele está exercendo sua liberdade de escolha. É verdade que é bom poder mudar de idéia na vida, mas a urgência das trocas pode estar denunciando que, como a criança chorosa, estejamos sentindo-nos desamparados, esperando que um objeto ou uma posição social possam garantir bem estar, certezas e aconchego. Talvez tudo dure pouco exatamente porque somos mutantes quanto a quem somos e o que queremos. Não nos sentimos inseguros porque a velocidade desestabiliza as coisas, pelo contrário: o culto à rapidez resulta da ansiedade de nossa busca por respostas e alívio. Essa incerteza é a fonte de tanta verborragia (muitas vezes escrita de forma telegráfica, para leitura imediata). O visionário Raul Seixas antecipou: já somos metamorfoses ambulantes e, com medo de perder-nos de nós mesmos, informamos incessantemente quem somos, nossa posição e estado. O mais legal é que supomos, e encontramos, interessados nessas informações. Câmbio.