O amor é nosso sintoma mais precioso (entrevista)

Entrevista de Diana Corso para o jornalista Jorge Salhani Webjornal Mundo Digital, para a matéria “Amar é” (http://www.mundodigital.unesp.br/webjornal/materia.php?materia=2625) JS: No que o amor pode modificar uma pessoa? O amor é nosso sintoma mais precioso. Dizemos sintoma, porque é como aquelas obsessões, temores ou pensamentos grandes ou pequenos, que fazem parte da vida, sobre as quais […]

Entrevista de Diana Corso para o jornalista Jorge Salhani

Webjornal Mundo Digital, para a matéria “Amar é”

(http://www.mundodigital.unesp.br/webjornal/materia.php?materia=2625)

JS: No que o amor pode modificar uma pessoa?

O amor é nosso sintoma mais precioso. Dizemos sintoma, porque é como aquelas obsessões, temores ou pensamentos grandes ou pequenos, que fazem parte da vida, sobre as quais temos pouco controle. A vida é cheia deles, preconceitos, ritos, coisas que fazemos sem querer ou que deixamos de fazer sem saber porque. Vivemos comandados por nosso inconsciente e também é assim que amamos. A questão é que uma relação, quando se estabelece, torna-se um duelo saudável de subjetividades, onde uma modifica a outra. Qualquer transformação, que nos liberte de modos pré-formatados ou estereotipados de funcionar é libertadora. Sendo assim, numa relação meus “sintomas” precisam negociar e dividir espaço com os do outro e assim ambos ganham, deixam de ser escravos de si mesmos. A loucurinha da gente, essa prosaica banal, ela existe, mas não a enxergamos. Já a do outro salta aos olhos. Uma relação é um espelho falante, como o da Bruxa da Branca de Neve, já que ela voltou à tona. Esse fica dizendo como somos belos e atraentes, afinal nos deseja e preza nossa companhia, mas também fica apontando nossas estranhezas. Amando, nos conhecemos melhor, querendo ou não.

JS: Como o amor é encarado pela geração Y? Ela ainda é idealista, procura o príncipe encantado? É carente? Devido à frustração por não encontrar a alma gêmea, entrega-se ao sexo sem compromisso?

Não temos motivo para crer em um tempo de vínculos frágeis e devassidão. Abandonar uma relação estável e cheia de compromissos mútuos e sociais em troca de relações fugazes, marcadas pelo desejo passageiro, não é novidade, principalmente para os homens. Outrora, porém, mantinha-se a fachada do casamento, digamos que a hipocrisia imperava. Na verdade, muitas vezes esses casamentos nem chegavam a ser uma relação de fato, eram duas pessoas que conviviam sem jamais se conhecer, mantendo, em geral o marido, uma animada vida erótica fora de casa. Isso tende a desaparecer, pois uma das exigências das novas gerações é a busca de uma coerência entre o que se sente e faz, há menos espaço para uma vida estruturada com base na falsidade e hipocrisia. Quanto às ilusões amorosas, bem, elas seguem sendo nossos mais queridos sonhos. Encontrar uma alma gêmea, alguém que nos compreenda além das expressões mais óbvias é uma fantasia herdada da infância. Só a mamãe, quando éramos bebês, se tivemos uma suficientemente boa, leu nosso pensamento desse jeito, antecipou nossos desejos, agiu em total sintonia com nossas carências. É um paraíso perdido, nunca deixaremos de lamentá-lo, além de idealizá-lo, pois na memória tudo é mais bonito. Depois de crescidos, esperamos do amor esse encontro com aquele outro perdido, o que nos compreendia e amava acima de tudo: mamãe. Muitas relações padecem de ser pouco frente a essa ilusão, pois os amados podem se perceber e viver um para o outro, mas no fundo, sabem ser sós e órfãos dessa fantasia da complementariedade perfeita. Enfim, a ideia de alma gêmea deriva de uma ilusão que leva a muitos mal entendidos e faz mais pelas separações do que pelas uniões.

JS: “O amor é cego”. Pode-se considerar este ditado popular verdadeiro em meio à Psicanálise?

Não completamente cego. Como acabamos tendo namorados dentro da mesma classe social e faixa de cultura, se fosse completamente cego seriam mais comuns relacionamentos assimétricos em termos de dinheiro e cultura, mas não é assim. De qualquer forma, as escolhas quando realmente o amor acontece, não obedecem a critérios que possamos domar. Até podemos descobrir por que viemos a amar fulano ou beltrano, mas só depois que a relação já se estabeleceu. O inconsciente não é cego, ele escolhe o que quer e nos deixa à margem do processo. Somos cegos porque não enxergamos seus desígnios.

13/06/12 |
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