O bom filhismo

Sobre a pesquisa A Voz dos Adolescentes

Com o nome de “A voz dos adolescentes”, a Unicef conduziu no Brasil uma pesquisa que interrogou  jovens entre 12 e 17 anos. Alguns dados causaram impacto: 70% dos jovens consultados sentem-se bem com a família, 95% consideram a família a instituição mais importante da sociedade e 84% consideram justa a forma como os pais os corrigem. As estatísticas confundem, uma vez que o estereótipo de adolescência que temos é o de rebeldia, agressividade e incomunicabilidade. Como explicar esse aparente “bom filhismo” que a pesquisa demonstra?

É visível a olho nu que os jovens do novo milênio são bastante ponderados e, mesmo entre os mais agitados, encontramos um discurso de relativo bom senso. Quase não se permitem devaneios utopistas, oposicionismos radicais e aventuras emocionais perigosas. Não quer dizer que não briguem em casa, que não se arrisquem na rua à noite,  transando sem camisinha, experimentando alguma droga ou negligenciando suas obrigações. Tal como aconteceu com seus pais, farão (ou desejarão fazer) alguma bobagem, a juventude implica uma certa leviandade.

O que surpreende é a possibilidade de comunicação. Se o adulto estiver realmente disposto a se aproximar, podem ponderar qualquer coisa em uma boa conversa. O conflito entre gerações cedeu espaço a outras ameaças maiores. Do mesmo lado da trincheira, a guerra agora é com a vida.

O mundo que espera os novatos é bem azedo. Já sabemos que a riqueza existe às custas de sofrimento alheio, que a ciência pode fabricar antibióticos e bombas, que o poder corrompe e que um certo sofrimento é inevitável. Eles têm direito a pouca inocência, por isso são “madurinhos” desde cedo e a infância termina antes. Quanto aos pais, coitados, quem não vê sua luta, sua batalha inglória para atravessar a floresta da vida?

Para pais e filhos, a postura no interior da família é basicamente solidária. Parece que ninguém é louco de derrubar os tênues vínculos de uma família tão humana e frágil, dentro de uma constelação pouco propícia. O jovem vai devagar com o andor, pois sabe que o santo de casa é de barro. Como diz a Legião Urbana na música Pais e Filhos: Você culpa seus pais por tudo/ E isso é um absurdo/ São crianças como você. Cresça-se com um barulho desses…

07/08/02 |
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