O que vem de cima

Sobre o filme Sinais

Estamos sós no universo? Sem resposta lançamos mão dos extraterrestres sempre que os deuses nos deixam à mercê da casualidade ou da responsabilidade sobre nossos atos. O poder do céu sobre nossas vidas é uma espécie de denominador comum aos tempos e às culturas. Deuses e extraterrestres se alternam em ocupar este lugar da transcendência. “Sinais”, último filme do diretor indiano-americano Night  Shyamalan une estas duas formas de fé.

No filme, o reverendo Hess perdeu a fé por ocasião da morte da esposa, é um homem paralisado pela derrocada de seu sistema de interpretação do mundo. Contrastando com o clima pacífico da fazendola americana, o além se insinua, predatório e destrutivo. O diretor atualiza o tema de “Guerra dos Mundos” (1898), de H.G.Wells, onde a paixão britânica pela rotina é contrastada pela irrupção do inesperado: uma invasão marciana. Antigo e atual, o livro evoca que vistos de cima não somos diferentes de um formigueiro. Vivemos em um mundinho fechado de eficiência, mas podemos ser esmagados pelo sapato de uma criatura maior. Em “Guerra dos Mundos” lê-se a fragilidade da estrutura social, sob pressão somos bovinos para morrer e selvagens para matar. Nossa civilização sucumbe quando perdemos os referenciais do cotidiano.

Entre Wells e Shyamalan, o mundo se povoou de Rambos duros de matar. Durante décadas acreditamos na tecnologia e na determinação guerreira dos humanos. No filme “Independence Day”, os terráqueos derrotaram os aliens embalados por estas crenças. O reverendo Hess vive a mesma impotência dos personagens de Wells, observa e custa a entender o que está acontecendo, mais filosofa do que faz. Ele é a cara do mundo pós 11 de setembro, se considerarmos esta data como a da queda do muro das certezas na viabilidade do sistema capitalista-globalizado. Descrentes do herói anabolizado, voltamos a apelar aos céus. Quando pequenos olhamos o mundo desde baixo, os pais são altos deuses onipotentes, quando crescemos ficamos sós. É o momento de ter fé.

É sempre de fora do formigueiro que vem o sapato que destrói a rotina, mãe de todas as certezas. O filme é religioso e convicto de que o mundo guarda uma certa lógica, embora nem sempre a compreendamos. É pena que tenha concluído em favor da fé, o mais infantil dos métodos de elaborar o desconhecido.

21/10/02 |
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