Papo chato.
O discurso vazio é chato. Cego e surdo, é garantia de desencontro.
Era melhor não perguntar à minha tia-avó como ela estava. A resposta incluía um relato minucioso da sua saúde, com ênfase no inquietante desempenho do seu intestino. Já com seu marido, era preciso tomar outros cuidados: o ponto delicado da conversa devia evitar assuntos relativos a trajetos e qualquer coisa que lhe oportunizasse relatar os seus. Teríamos uma explicação dos caminhos que ele percorreu mais longa do que os propriamente ditos, dos desvios e as obras que o obstruíram, do tempo das sinaleiras e outros detalhes imperdíveis. Não pense que estou sendo intolerante com a velhice dos parentes, eles eram assim mesmo antes da visibilidade das rugas.
Essa dupla deixava bem claro que, para alguns, não existe aquela pergunta que na verdade não passa de uma formalidade: – “como vai?”; “tudo bem!”. Da mesma forma, observações sobre o trânsito ou clima na verdade são apenas saudações. São questionamentos gentis, sem a intenção de receber um boletim informativo.
O diálogo vazio no encontro com o vizinho ou colega também pode ser sobre o time, sobre alguma calamidade, a proximidade das férias, o crescimento dos filhos, a saúde do cachorro ou qualquer outra banalidade. É como um abraço verbal. Poderíamos até nada dizer e fazer alguns gestos com as mãos, ou mesuras e volteretas, se assim fosse nosso hábito cultural, mas trocamos umas palavras. Há diversos níveis de encontro, alguns incluem verdadeiras conversas, outros somente o palavrório das gentilezas. Meus tios-avós eram chatos pela impossibilidade de compreender essas diferenças.
Um diálogo tem a dinâmica de uma dança, varia conforme o tipo da música. Palavras são como os passos dos bailarinos que devem saber seguir o ritmo e o parceiro. Chato é aquele que não escuta, fala sozinho, aborrece o interlocutor com uma conversa que não leva em conta a música nem o outro. Há chatos narcisistas, egocêntricos, sempre têm muito a dizer, mas não importa a quem. Outro tipo de chato é o que se perde no próprio labirinto do pensamento, como meu tio falando do trânsito. Eles ocupam o espaço sonoro, mas não conseguem dizer nada relevante e esterilizam o diálogo. Como no caso da tia, há os que estão tão submersos em seus sofrimentos que esqueceram como é olhar para fora, chamam o interlocutor para o único lugar que conhecem: seu próprio interior.
Meu trabalho é uma luta cotidiana contra a banalidade das palavras. Sou grata àqueles que arduamente separaram uma preciosa fatia de seu tempo para ir ao meu consultório e me esforço para que não o façam à toa. Posso até acolhe-los com um bom abraço verbal, mas fico atenta às estrofes de verdade audíveis na música das suas palavras.