Tristeza Real
Sobre os 10 anos da morte e a infelicidade da Princesa Diana
Após 10 anos da morte da princesa Diana, lembrados no último dia 31, sua memória ainda é cultuada pelos súditos transformados em fãs. Seus 16 anos de reinado foram marcados tanto pela filantropia, onde foi inovadora, quanto pela identificação com as esperanças e tristezas de qualquer plebeu.
Quando ela se casou, ignorando a cilada aristocrática que promoveu sua união, o evento foi tratado como um Conto de Fadas. Charles tinha que desposar uma jovem nobre, anglicana e virgem que lhe fornecesse um herdeiro. Apesar da duradoura relação com Camilla, ele escolheu Lady Diana Spencer, promovendo uma cerimônia vistosa para divertir o público global. Logo a função de esposa oficial foi ficando evidente e mais uma vez o público foi convocado, desta vez para compartilhar sua tristeza. Decididamente, não se fazem mais príncipes e princesas como antigamente.
Diana deprimiu-se, teve transtornos alimentares, tentou suicídio, teve amantes, declarou que seu marido era um banana incapaz de ser rei. Ela alardeou sua inconformidade pelo casamento sem amor, lamentou-se em público. Sua depressão pós-parto revelou que ser mãe de um herdeiro real não era capaz de fazê-la feliz. Sua bulimia demonstrou que não haveria iguaria do palácio que valesse permanecer em suas entranhas. Foi a princesa da depressão, da recusa enfastiada de tudo o que o dinheiro ou o prestígio pudessem comprar.
Os problemas reais e Reais que enfrentava foram sempre atribuídos aos outros: se teve amantes, era por ter sido traída, se estava triste, era por viver em meio à hipocrisia e à frieza do palácio. Nada de novo nisso, é sempre assim que começa o relato de nossos males, num primeiro olhar achamos que é tudo culpa dos pais, amantes, amigos, colegas e chefes que nos maltratam. Muitas vezes eles realmente não prestam, mas sempre cabe a questão de qual é a nossa participação na construção dos sofrimentos que nos atingem. Além de insatisfeita, Diana foi uma princesa queixosa.
Como Lady Di, nós também sempre achamos pouco o que temos. Trocamos de amores como de marcas de carros, mudamos de casa, de profissão, de cidade, de modo de vida, agitados, inconformados, em busca da felicidade que achamos que nos foi prometida. Ela viveu rápido e morreu jovem. Talvez isso seja um ideal para todos nós, morrer enquanto ainda podíamos querer tudo, ignorantes dos sonhos que nunca se realizam. Sobreviver à juventude implica algum grau de controle da onipotência. Viver mais obriga a aprender a saciar-se, por isso mesmo a massa de anoréxicas está entre as jovens. Essas moças famélicas, em nome dum ideal de beleza, recusam toda relação, vivem para sua insatisfação com todo tipo de vínculo, representado pelo alimento.
Diana padeceu da mesma infelicidade crônica contra a qual nós plebeus nos drogamos, sua juventude bela e poderosa evocou nossa idealização da adolescência, sua bulimia expressou a tentativa de controle sobre seu corpo e vínculos. Foi de fato uma “Princesa do Povo”, popular em gestos e sentimentos, reinou sobre seu tempo como poucas.