Um investimento de risco
Sobre o investimento nos filhos
Já dizia Vinícius de Moraes: “filhos, melhor não tê-los, mas se não tê-los, como sabê-los?” Mas o que ficamos sabendo quando criamos outro ser humano? A resposta é: mais de nós mesmos. Freud dizia que os filhos são uma extensão do narcisismo dos pais, ou seja, eles são vistos como o que gostaríamos de ser e damos a eles o que gostaríamos de ter. Há pouco altruísmo na parentalidade. É indiscutível que se pode amar um filho mais que tudo e que sua perda é a mais irreparável. Um amor egoísta não deixa de ser amor. Porém, graças aos céus os filhos são demasiado humanos e, como tais, são um investimento imprevisível, arriscado e surpreendente.
Temos aquela frase que muitos gostam de usar: “crio meus filhos para o mundo, não para mim”. Isto faz parte do projeto de pais bem intencionados, que respeitam as escolhas dos filhos. Queiramos ou não, os filhos se criam para o mundo, sempre que se salvem das patologias que colam a prole à casa paterna, inutilizando vidas e abortando destinos. Mas o mundo que eles escolherão dependerá desses ideais que o narcisismo dos pais delineou. Se os quisermos ricos, poderão ser empresários, empreendedores delirantes, franciscanos ou economistas. O certo é que travarão algum diálogo com a questão do dinheiro. Se os desejarmos sábios, quiçá sejam doutores honoris causa, mas também podem escolher ser mestres de algum grupo esotérico ou adotem alguma forma de vida rudimentar para provar que a verdadeira sabedoria está nas coisas simples. Os filhos partem para o mundo para produzir a sua versão do que colocamos em suas vidas sem saber, pois é com o inconsciente que lhes apontamos caminhos.
Tampouco é bondade encher os filhos de mimos. Afinal quem é que se satisfaz dando-lhes brinquedos, tênis ou bolsas cujo valor pode ser calculado em salários mínimos, sem que jamais tenham tido a experiência de pegar um ônibus, ficar sem dinheiro ou se entediar? Neste caso, eles são um cartão de visita dos pais, coloridos e desenhados de forma a representar todo o poderio econômico da família. Aliás, esta postura de não valorizar os luxos que tem, o fastio que muitos jovens trazem estampado na face, só ressalta que toda esta parafernália consumista não responde aos seus desejos, mais bem faz deles um objeto dos pais. O mesmo vale para o trabalho. Não há quem não tenha queixas de que se esforçou muito para usufruir pouco, portanto aos descendentes cabe a vadiagem. Não adianta reclamar que sua prole não valoriza o que recebe, que não tem noção do esforço. Se lhes é passada a mensagem de que gozar a vida significa abundância de objetos e lazer ilimitado é isso que eles farão. Os filhos são obedientes.
Ser pais é como fazer um raio X da alma. Se sua vida tem algum sentido capaz de transcender os objetos que você puder adquirir, se você acha o seu trabalho relevante por alguma razão, se você amou alguém ou algo, tudo isto e muito mais, seu filho saberá. Não de um saber sábio, do tipo que podemos enunciar, mas isso o proverá da matéria prima com a qual ele vai fabricar sua vida. Por isso vale a pena sabê-los, porque neles encontraremos o que somos ecoando em alguém.