Você faria um casamento grego?

Sobre o filme Casamento Grego em 04/12/2002

O sucesso da comédia romântica Casamento Grego pode ser entendido como a infalível queda do público para a água-com-açúcar, mas não é o seu único atrativo. Há algo mais: o casamento em questão é baseado em amar a diferença, quando o usual hoje é se apaixonar pelo espelho.

A noiva é mais simpática que bonita e ainda pertence a uma fechada comunidade de gregos que não costumam casar com “estrangeiros”. Foram fazer a América, porém a assimilação à cultura do país de adoção é difícil para os mais velhos. O noivo poderia ser qualquer um de nós. Pertence a uma família bem inserida no projeto individualista: não importa sua origem, aproveite as oportunidades, faça o menor número de vínculos para não atrapalhar sua ascensão e relacione-se com gente que pareça com o que você gostaria de ser.

Em muitas histórias de fadas, um dos membros do casal é desprovido de nobreza e deve que passar por provações e combates contra monstros, bruxas ou decifrar charadas para conquistar uma espécie de adoção pelo reino do noivo ou da noiva. A lição é verdadeira, casar é se fazer adotar pelo outro, com seus hábitos, paladares e referências, uma verdadeira provação. Casamento Grego tem esta estrutura, o rapaz precisa passar por inúmeros constrangimentos e testes até ser aceito pelo austero patriarca grego. Ela também teve suas provações: desafiar o pai e enfrentar o mundo fora da família para conquistar o noivo.

Os noivos do filme amam-se por serem estrangeiros um ao outro. Quando restringimos nossas escolhas amorosas ao mundo estereotipado da Barbie e do Ken, onde corpos e mentes são iguais, logo aparece a fragilidade das relações e a troca constante, culpando o parceiro pela inconsistência e mesmice da experiência. Escolher um igual é casar com e espelho que, se desse uma resposta decente, não tinha que estar sendo consultado toda hora. A fantasia de Casamento Grego recupera um dos principais temperos do amor: o desafio de habitar o estrangeiro reino do outro. Este é um ganho dos tempos modernos que, se tivéssemos permanecido na sociedade tradicional dos casamentos arranjados e previsíveis, tampouco teríamos. Fazer do amar uma viagem, não de turismo, mas de descoberta, daquelas em que nem o descobridor nem o mundo nunca mais voltam a ser o mesmo.

04/12/02 |
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