Presentear
Sobre o consumo natalino
A religião cristã ganhou, pelo menos nos rituais, a guerra das religiões e colonizou o mundo ocidental. Ninguém mais está livre do Natal. Além da refeição opulenta, faz parte da noite a troca de presentes, hoje uma prática burocrática, estereotipada e universal. Por isso não são insignificantes as acusações de que a verdadeira celebração do Natal seria ao “deus do consumo”, cultuado no templo do Shopping Center, com a imolação sacrificial do décimo-terceiro salário ou do cheque especial.
Mi Buenos Aires querido
Sobre um período de decadência portenha em 09/01/2002
Habituamo-nos a criticar argentinos em geral e portenhos em particular devido à sua pretensão de serem europeus, acima de nossa condição latina, pobre, mestiça e calorenta. Por outro lado, sempre que o bolso permitiu, corremos às suas ruas largas, livrarias, cafés, parques e museus para respirar um pouco do velho mundo. A Argentina que naufraga hoje é também nossa, não só porque os modelos econômicos se assemelham, mas porque ela é um lugar psíquico para os brasileiros. Vê-la tão triste é também roubar a alegria de lembranças de luas de mel e viagens que tantos brasileiros fizeram, de tantos tangos escutados.
MINI-MONSTROS
Sobre o filme Monstros SA
Crianças são apaixonantes, cheias de frases e gestos surpreendentes, amolecem a alma, despertam ternura, conectam qualquer um com sua breguice interior. Crianças são insuportáveis, inconvenientes, barulhentas, sujas e cada vez mais espaçosas.Crianças são anjos e monstros.
A melhor crônica dos últimos 15 minutos
Sobre o disco dos Titãs
O novo disco dos Titãs vem com o curioso título: “A melhor banda de rock de todos os tempos da última semana”. O título já é bom, mas há a letra da música homônima é melhor. Começa assim: “Quinze minutos de fama/ mais um pros comerciais/ quinze minutos de fama/ depois descanse em paz” retomando a famosa frase de Andy Warrol.
Os normais: amor com humor
Sobre o programa humorístico Os Normais em 14/11/2001
Vani ergue a cabeça, sai do entrevero erótico, olha o telespectador e diz: não se iluda, estou pensando em outra coisa. Rui também sai da cena e expõe suas ridículas mesquinharias. Está no ar “Os normais”, uma sátira da relação amorosa que tem cativado até o público menos televisivo.
Finados mas não findos
Sobre a morte
O enterro que mais nos preocupa é o nosso. Quem não fantasiou estar presente à cena de seu próprio velório para observar as homenagens de que seriamos objeto? Muitas vezes quando tristes imaginamos nossa morte como forma de suprema vingança, pois é aí que eles (os que não souberam nos amar) sentiriam nossa falta. De qualquer maneira depreende-se daí que não supomos a morte sem lhe atribuir um beijo de adeus, tão importante que por ele chegamos a imaginar morrer.
Harry Potter e a magia da leitura
Sobre o livro de Rowling em 10/10/2001
Agradeço a Sra. Rowling por lembrar a todos que o livro tem futuro, basta escrever a coisa certa. O mais interessante deste sucesso editorial é o pasmo com que foi recebido. Incrível,crianças lendo…
Todo mundo em pânico
Sobre os atentados 11 de setembro
“Inferno na Torre”, “Alien”, “Tubarão”, “Independence Day”, “Armagedon”, “Pânico”, “A Bruxa de Blair”, “O Exorcista”, a lista é infindável. Como se duas grandes guerras mundiais não houvessem nos saciado de traumas e catástrofes, produzimos o horror como forma de lazer. Por que precisaríamos cultuar os nossos medos?
Um adolescente de meio século
A atualidade do “Apanhador no campo de centeio” Quando um texto aniversaria, tendemos a dizer-lhe o mesmo que a uma pessoa: “estás jovem!”. Por isso no cinquentenário do “Apanhador no campo de centeio” o óbvio seria comentar a sua atualidade e o quanto ele foi inovador. É perfeitamente possível lê-lo, se subtrairmos as referências históricas, […]
A atualidade do “Apanhador no campo de centeio”
Quando um texto aniversaria, tendemos a dizer-lhe o mesmo que a uma pessoa: “estás jovem!”. Por isso no cinquentenário do “Apanhador no campo de centeio” o óbvio seria comentar a sua atualidade e o quanto ele foi inovador. É perfeitamente possível lê-lo, se subtrairmos as referências históricas, como o discurso contemporâneo de um adolescente.
Crônica de uma geração
Sobre Feliz Ano Velho de Marcelo Rubens Paiva
Marcelo tinha vinte anos de idade e deu um mergulho quase fatal, a década de 70 findava, passavam 8 anos que seu pai havia sido engolido pelos porões da ditadura. Assim que pôde, escreveu. Paralisado, teve o distanciamento necessário para contar a vida privada da juventude que cresceu no regime militar. Jovem no tom entesado, maduro como o olhar de um velho, o relato do livro é temporalmente ímpar. Escrito numa época da vida em que se fala mais do que se pensa, se pensa mais do que se entende, se faz mais do que se sente e se sente mais do que se suporta.